quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Série Pais I – Ultrassonografia

Era madrugada e ele veio até nós pedindo ajuda.

Estávamos na rua fazendo o trabalho de sempre, de conversar e ouvir pessoas. Levado uma palavra de Paz. Naquele canto, onde haviam homens sem destino, perdidos e desnorteados em meio à sua miséria, ele veio.
Usava muletas, não tinha mais uma das pernas. Chamou-nos no canto para conversar à parte. Seus olhos verdes estavam inquietos, não nos olhavam no rosto. Seu rosto sujo não conseguia disfarçar a pouca idade. Era claramente mais jovem que eu. Tentava nos falar enquanto olhava inquietamente para os lados como se estivesse aflito, esperando por alguma coisa.

Ele pediu oração por sua filha. E de um canto embaixo daquela marquise ele tirou uma pasta. No meio daquele lugar que não havia nada além de sucata e drogas, ele lançou mão de uma ultrassonografia! Ele estava com as primeiras imagens da filha guardada com ele naquela calçada. Não havia quase nada com ele, na rua, além daquela pasta.

Fiquei espantado e atônito enquanto ele tentava se comunicar, mas suas palavras mal saíam da boca. Subitamente olhou para um canto, chamou por alguém e pediu que lhe guardasse seu “cachimbo”. Empunhou novamente as muletas e saiu apressadamente para seu colega de rua. Saiu interrompendo a conversa como se ela jamais tivesse acontecido. Do nada foi embora e nos deixou plantados e atônitos, como se o momento se desfizesse em nossa frente em questão de segundos.


Momentos depois, meu amigo que estava naquele momento comigo me olha e diz: “Essa é a realidade Thiago. Os outros jovens não estão nem aí pra isso”. Contendo emoção, continuei nosso caminho, andamos noite à fora, mas desde aquele dia algo lateja em minha mente: “Aquele, era um pai!”.

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